Joana Vasconcelos, a artista portuguesa mais reconhecida internacionalmente na atualidade, é conhecida pelas suas instalações de grande escala que desafiam as conceções tradicionais sobre o feminino. O seu trabalho percorre o mundo através de exposições e encomendas que refletem a sua abordagem única e provocadora. Em 2012, Vasconcelos tornou-se a primeira mulher a protagonizar a prestigiada exposição anual no Palácio de Versalhes.
Uma das suas obras mais icónicas, Marilyn, um par de saltos altos com nove metros de altura construído a partir de inúmeros tachos de aço inoxidável, integra a coleção permanente do Museu Arter, em Istambul. Outras criações suas encontram-se espalhadas pelo mundo, incluindo em Waddesdon Manor, residência inglesa da Fundação Rothschild. Jacob Rothschild, um conhecido colecionador de arte, referiu-se à peça Wedding Cake, parte da coleção da fundação, com entusiasmo: “Não conseguimos resistir à sua ‘Wedding Cake’.”
No dia seguinte às eleições presidenciais dos Estados Unidos, durante uma conversa via Zoom, Vasconcelos comentou a derrota de Harris: “Está a surgir um novo paradigma, sem retorno, mas vai levar tempo até que as pessoas mudem.” Questionada sobre se se considera feminista, respondeu: “Sinto-me abençoada por viver numa parte do mundo onde as mulheres têm os mesmos direitos que os homens, mas em muitos lugares isso ainda não é uma realidade.” Apesar disso, evita o rótulo de feminista, considerando-o limitador. “Acho que o conceito nem deveria existir, só deveria haver humanidade.”
Nascida em Paris em 1971, Vasconcelos mudou-se para Portugal com os pais em 1974, após a Revolução dos Cravos. “Estou baseada em Lisboa, mas considero-me uma artista europeia. Sou um produto tanto da cultura europeia como da portuguesa, uma embaixadora de ambas. Cresci num país com uma forte influência barroca; é natural que o Barroco esteja presente no meu trabalho. Contudo, este período cultural marcou várias regiões da Europa.”
A artista reconhece o impacto de mulheres pioneiras na sua trajetória. “Sou o resultado das mudanças que as artistas mulheres introduziram na história da arte, passo a passo.” Entre as suas maiores influências, destaca Louise Bourgeois, Niki de Saint Phalle e Annette Messager.
Arte Feminina e Portugal
Vasconcelos reflete sobre ser artista em Portugal, especialmente mulher. “Helena Vieira da Silva teve de ir para França; não podia voltar para Portugal. Paula Rego emigrou para Inglaterra para poder expressar-se livremente, porque, na altura, Portugal não conseguia aceitar artistas desta dimensão. Sinto-me privilegiada por conseguir trabalhar a partir de Portugal e não ter de ir para Paris ou Londres para me afirmar como artista internacional.”
Inspirada pelo artista conceitual Marcel Duchamp, Vasconcelos afirma: “Todo o meu trabalho parte de ideias, e não de materiais ou escala. Nesse sentido, sou uma artista conceitual, mas também podem associar-me aos Nouveaux Réalistes, ao Surrealismo ou à Pop Art.”
Recontextualizar o Quotidiano
A artista é conhecida por transformar objetos do quotidiano, atribuindo-lhes novos significados. “Se olharmos para a obra The Bride (2005), um lustre composto por 14.000 tampões, o que faço é incorporar o objeto, sem o alterar, para criar algo novo que faz as pessoas pensarem de forma diferente.” O mesmo processo aplica-se aos tachos utilizados em Marilyn. “O tacho define a escala da obra, que resulta diretamente do conceito.”
O trabalho de Vasconcelos também desconstrói elementos da cultura portuguesa. “Quando uso um tacho para criar um sapato glamoroso, estou a questionar o papel tradicional da mulher como dona de casa, mãe ou cuidadora, e a sugerir uma nova perspetiva – uma mulher com vida pública e dona da sua sexualidade. Isso levanta uma questão: onde estamos? No futuro ou no passado?”
Joana Vasconcelos continua a ser uma voz de destaque na arte contemporânea, não só em Portugal, mas globalmente, desafiando perceções e inspirando novas formas de pensar a arte e o papel da mulher na sociedade.